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terça-feira, 26 de novembro de 2013

Mesma cidade, realidades distintas.

Acabo de ler e de compartilhar com meus amigos nas redes sociais que a Granja Comary está recebendo investimento na casa dos 15 milhões de reais para receber a Seleção Brasileira durante a Copa do Mundo do ano que vem.

Na matéria do GLOBO.COM não fica muito claro se o investimento vem da própria CBF ou se tem alguma participação do Governo Federal. Mas, sinceramente, isso é o que menos importa. Os valores já falam por si.

Todos lembram que em janeiro de 2011 a Região Serrana do Rio de Janeiro sofreu com fortes chuvas e o total de mortos passou dos três dígitos. Na mesma cidade da Granja, Teresópolis, pude presenciar cenas que nunca sairão da minha cabeça, como famílias destruídas, crianças órfãs, carros em cima do telhado de casas, bairro desaparecido sob as lamas; entre outros espirais de imagens, sons e cheiros que jamais me abandonarão.

O que causou maior perplexidade nesse evento foi o descaso dos poderes públicos, principalmente dos municípios. O Governo Federal liberou verbas para reconstrução da infraestrutura, bem como das casas e todo aparato que foi destruído, mas somente uma minoria dos atingidos conseguiu ter algum tipo de melhoria - muitas vezes amparados por pessoas físicas, vizinhos, voluntários... E o dinheiro? Boa pergunta. A chave para essa questão parece ser uma reprodução do que temos de mais comum e mais sujo na política brasileira: desvios, roubalheira e descaso.

Não tenho documentação para acusar ninguém e seria leviano fazê-lo, mas não precisa ser muito inteligente para imaginar o destino dos quase 800 milhões de reais que foram liberados, principalmente pela situação da região, que, de alguma forma, ainda não foi normalizada - algumas áreas rurais sofrem com as consequências dessas chuvas e muitos pequenos produtores não conseguiram se restabelecer.

Volto a esse assunto pela proximidade do tema e pela indignação que me causa esse tipo notícia relacionada à Teresópolis - e demais cidades Serranas. Estamos num momento de confusão/inversão total de valores, de naturalizar alguns descalabros, de achar normal uns pequenos luxos em nome da vitória da Nação numa competição como uma Copa. Mas um absurdo desses não pode acontecer com Teresópolis ainda respirando aqueles duros dias, em que vi a cidade que fui criado com um ar de pós-guerra, as pessoas num semblante pesado, a cidade mobilizada para chegar com mantimentos nos mais distantes lugares; o homem que vi com lama até o pescoço salvo pelo vizinho, etc.

Mas não, eles estão caprichando na suite master do Felipão! 15 milhões de reais investidos, quase uma aplicação de um dinheiro acompanhada de um sorriso cínico contra a população da cidade. Ou os valores estão invertidos, ou sou apocalíptico demais!?

Posso estar sendo piegas, mas não consigo separar as coisas quando presenciamos momentos tão diferentes. Se, por um lado, cansei de ver gente do bem daquela cidade não saber mais o que fazer para ajudar, abusando da criatividade para prestar algum tipo de serviço aos muitos que precisavam; por outro, vimos o dinheiro sumir e agora esse investimento astronômico no luxo dos heróis da Nação do futebol. O que pensar? Como separar as coisas? Como acreditar num país que trata de forma tão diferente sua população?

Infelizmente, só tenho perguntas. Sou um apaixonado por futebol, de ir no estádio torcer pelo meu time, mas a proporção econômica que o futebol tem tomado me preocupa e me enoja. Essa ligação do DESCASO X INVESTIMENTO na Granja, pode pecar ao colocar sujeitos distintos numa mesma análise (pois o investimento de uma situação não tem a ver, necessariamente, com o outro), mas a distância entre as realidades jamais será internalizada para mim como algo natural. Teresópolis ainda agoniza, mas será palco de festa num berço de ouro.

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