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quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

Na ótica do menino.

- Pai, mas aquele senhor sentado na rua, é assim mesmo?
- Assim mesmo como, filho? A vida é assim, uns não têm dinheiro então vão morar na rua mesmo.
- Que estranho, pai, a tia da escola fala sempre que temos que ajudar as pessoas. Ninguém ajuda aquele homem? - franziu a testa o pequeno Gustavo.
- Deve ajudar sim, tanto que ele está vivo. Só não tem uma casa. - tentou desconversar Cláudio, com o ouvido atento no menino e de olho no trânsito caótico.
- Só não tem uma casa... - repetiu alto o menino - engraçado que na nossa família somos três: Eu, você e mamãe e temos duas casas. Não poderíamos ajudar aquele velinho?
- Ajudar como, Gustavo? Dando nossa casa da praia para ele morar? - perguntou Cláudio escondendo o sorriso.
- Por mim tudo bem. Nós nunca vamos lá mesmo.
- A vida ainda vai te ensinar muita coisa, garoto... - concluiu o pai, torcendo para que seu filho se adapte logo a dura desigualdade da vida adulta.

(...)

Mais tarde, voltando da escola com a mãe, o mesmo Gustavo percebe crianças de rua num parque, cheirando alguma coisa que ele desconhece.
- Mãe, olha aqueles meninos. Eles estão sempre nessa pracinha. O que eles estão cheirando? - perguntou o imperdoável Gustavo.
- Eles meu filho... - tentou ganhar tempo Rosário - estão fazendo uma coisa muito feia, sabe?
- Mas parece ser bom, eles não param de rir - sorriu o menino.
- Não fale besteira, meu filho. Aquilo é uma coisa horrível, que nem adulto e muito menos criança pode fazer. Eles estão fazendo isso porque moram na rua, não tem os pais para educar - tentou conscientizar o pequeno.
- Moram na rua? Que terrível, né mãe? Como eles fazem para dormir? - não parava de questionar.
- Dormem na rua mesmo, na praça. Ou então vão para abrigos passar a noite - concluiu uma impaciente mãe.
- Abrigo? Deve ser um lugar legal, né? Cheio de crianças dormindo juntas. Posso passar uma noite num abrigo, mãe?
- CHEGA, Gustavo! - sentenciou Rosário.

(...)

Gustavo chegou no outro dia na escola com a novidade do abrigo na cabeça. Falou com os amiguinhos e combinou com eles que juntariam a turma para dormirem num abrigo. Na volta para casa, cheio de novidades, disparou para a mãe:
- Mãe, eu e meus amigos combinamos de passar uma noite num abrigo - antes da mãe retrucar, (ou bater o carro) Gustavo continuou - vai ser lá no sítio do Rafael, tá?
- Ah é? - perguntou uma aliviada Rosário? - E como vai ser isso?
- A gente vai passar o final de semana lá. Cada um leva suas coisas, mas só vale roupa velha.
- Roupa velha? Vou separar para você levar então - concordou a mãe.
- Ah, e combinamos de juntarmos as garrafas de plásticos para levar também.
- É meu filho, mas para que isso? - já perguntou imaginando a resposta de Gustavo.
- Para imitarmos aqueles meninos da pracinha, que brincam sem parar e parecem muito felizes - concluiu assustando a mãe.
- Mas você não é feliz, meu filho? - arregalou os olhos Rosário - você tem tudo - concluiu.
- Sou feliz sim, mãe. Mas nunca me diverti daquela maneira, como vejo todos os dias os meninos na pracinha - afirmou o sincero Gustavo.

11 comentários:

Anônimo disse...

Gostei das crônicas. Deveria tentar publicar seus trabalhos. Não dá bobeira, não, ok?

Anônimo disse...

Pobre Gustavo...

Anônimo disse...

vc expõe opiniões diferentes d tudo o q se lê por aí. Meus parabéns!

Suelen disse...

gostei muiitooo!
parabéns!
;*

Anônimo disse...

Ô muleke chato esse tal de Gustavo!
Teu Blog é legal, véio, parabéns!
Abraço,
Hamster...

http://cabecasvaorolar.blogspot.com/

AYLA disse...

pober gustavo , para as crianças tudo está bem está perfeito mas quando crescem e se deparam com a dura realidade que é a vida...
acho que por isso nos convertimos em adultos tão vazios, por essa decepção...

Anônimo disse...

Ô cara.
Para de enrolar e escreve o segundo capítulo de MUNDOS OPOSTOS.
Não se esqueça que você devendo esta.
Mãos à obra.
Como sempre o blog tá muito bom.
Rubem-terapiadecutuvelo.blogspot.com

Tiago Cervo disse...

Ih gostei muito, texto muito legal mesmo. E sem falar q pode mostrar as coisas pelo olhar desse personagem.

Grande abraço

http://www.mulheresimperfeitas.blogspot.com/

assis horta disse...

Carlinhos, eu ia cobrar a continuação daquela crônica "Mundos Opostos", mas, o Rubem já o fez.
Gostei da crônica de hoje.Aquele velho que mora na rua poderia se inscrever no PAC da Dilma que vai construir 500.000 casas até 2010. É mais um vota que a guerrilheira vai contabilizar para sua eleição.

Sonia Schmorantz disse...

A palavra mágica
dorme na sombra
de um livro raro.
Como desencantá-la?
É a senha da vida
a senha do mundo.
Vou procurá-la.
Vou procurá-la a vida inteira
no mundo todo.
Se tarda o encontro, se não a encontro,
não desanimo,
procuro sempre.
Procuro sempre, e minha procura
ficará sendo
minha palavra.

Carlos Drummond

Lindo domingo!
abraços

Rafael Horta disse...

Muito bom texto, primo. Continue escrevendo, continuaremos lendo.

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